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POESIA, A ARTE DO ESTRANHAMENTO


POESIA, A ARTE DO ESTRANHAMENTO

 
"É preciso, portanto recuperar por detrás do momento hábito o momento do estranhamento. Esta recuperação se chama pensar..." Cabe à filosofia e também à poesia recuperar a estranheza das coisas, mostrar que o cotidiano e o habitual, em sua aparente monotonia, esconde o mistério do ser" ( Jardim, citado no livro Psicologia Fenomenológico Existencial de Waldemar Angerami Camom Org. vários autores).


Clássica e Pioneira
Edição reúne obra completa de Yu Xuanji, poeta chinesa do século IX morta aos 25 anos
 Por Gilberto Scofield Jr.
Um dos períodos de maior efervescência econômica e cultural da China aconteceu durante a Dinastia Tang (618 a 906), considerada por muitos historiadores como a Era de Ouro da poesia chinesa na longa série de dinastias imperiais (regionais e nacionais) que governaram o país até 1912. Trata-se de uma produção herdeira da poesia clássica expressa em cantos antigos, como o Shi Jing ("Livro de Poesia"), na Dinastia Zhou (1045-256 a.C.), ou Chu-ci ("Cantos do País de Chu"), no período dos Reinos Combatentes (século IV a.C). Há, no entanto, entre os chineses a compreensão de que a antologia "Poemas completos da DInastia Tang" - uma compilação de cerca de 50 mil poemas de mais de dois mil autores, organizada durante o ´seculo XVII na Dinastia Qing (a última da China Imperial) - e até hoje a mais importante e expressiva mostra do que foi a poesia clássica chinesa, inspiradora de poetas chineses até hoje, incluindo as sofríveis investidas literárias do líder Mao Tsé-Tung no mundo dos versos.

Pois foi neste caldeirão cultural da DInastia Tang que a Editora da Unesp, em parceria com o Instituto Confúcio da universidade, foram buscar a primeira mulher chinesa a ter sua obra completa traduzida do original diretamente para o português: a cortesã e sacerdotisa taoísta Yu Xuanji (844-869). A Unesp acaba de mandar para as livrarias de todo o país a "Poesia completa de Yu Xuanji", uma coletânia de 48 poemas e cinco fragmentos da jovem poeta, morta aos 25 anos. Numa época onde as mulheres não podiam participar dos exames públicos para cargos no governo, mas tinham relativa liberdade  para se educar. Yu Xuanji se destacou falando da condição e sentimentos femininos, incluindo considerações de caráter sensual, algo impensável na época.

Trabalho precioso pelo ineditismo e cuidado de edição

O livro traz as poesias em edição bilíngue chinês-português e uma breve apresentação da vida da poeta com base na bibliografia que sobreviveu ao longo dos milênios num país cujos governantes - do déspota Shi Huang Di que em 206 a.C. ordenou a destruição de todos os livros do império, exceto os de agricultura e medicina, até Mao Tsé-Tung, cuja Revolução Cultural (1966-1976) praticamente exterminou a produção cultural do país - não são exatamente reconhecidos pelas ações de preservação histórica.

Trata-se de um trabalho de fôlego e precioso pelo ineditismo e pelo cuidado de edição. O trabalho de pesquisa de material e tradução ficou a cargo do poeta e diplomata Ricardo Primo Portugal, que trabalha e vive na China desde 2005 (em Pequim, Xangai e, desde o ano passado, em Guangzhou, antiga Cantão) e sua mulher a tradutora e intérprete de inglês e português Tan Xiao, de quem partiu a idéia de trazer Yu Xuanji para o português.

- A Dinastia Tang foi caracterizada por uma cultura cosmopolita, esclarecida, tolerante, que realizava intercâmbio constante com o exterior e que já era depositária de uma tradição milenar - diz Ricardo Portugal, co-organizador de uma antologia de Mario Quintana, curiosamente o primeiro poeta brasileiro traduzido para o chinês - Era uma ambiência cultural coesa, na qual a produção literária era muito prolífica, e com um nível muito elevado e bem definido de elaboração formal. Para se ter uma idéia, só na poesia, aqueles 300 anos legaram ao mundo mais de 2300 autores até hoje lembrados (190 deles mulheres), dos quais vários são citados sempre como os mais importantes expoentes da cultura chinesa - Li Bai, Tu Fu, Wang Wei, Bai Juyi, Meng Haoren. Foi um tempo de gigantes.

- A sugestão de Portugal e Tan Xiao coincidiu com o nosso interesse em ampliar o intercâmbio cultural entre Brasil e China - conta Luís Antônio Paulino, diretor executivo do Instituto Confúcio na Unesp.

Portugal observa que a Dinastia Tang foi um dos períodos da história do mundo em que a condição da mulher era, comparativamente mais igualitária  em relação aos homens; uma condição bem mais favorável que aquela encontrada em outros períodos, inclusive posteriores na própria China. Ainda que excluídas do sistema dos exames imperiais que selecionavam a elite dominante e impedidas de exercerem funções administrativas, muitas filhas de famílias abastadas chinesas podiam adquirir educação e conhecimento literário. Mesmo assim, as "moças de família" não eram, em geral, encorajadas a escrever poesia.

- Nessa sociedade floresceu uma casta de cortesãs cultas, amiúde mais livres que as esposas. As mais talentosas eram versadas nas artes clássicas (música, poesia, caligrafia e pintura). Também as sacerdotisas taoístas eram mulheres de vida autônoma, que gozavam de considerável liberdade em suas relações sociais. Muitas participavam ativamente da vida cultural e literária da época, mantendo festas e saraus em suas residências. Yu Xuanji foi, em diferentes momentos da sua vida, concubina (a segunda esposa de um funcionário), cortesã e monja taoísta
- Diz o diplomata.

Antes de Yu Xuanji, diz ele, não se falava de amor na poesia chinesa de maneira tão aberta e sensual. Pela primeira vez, uma voz assertiva e explícita em relação ao desejo da mulher e da sua vontade de igualdade social foi ouvida por muitos. Além disso, segundo os historiadores Yu Xuanji foi uma poeta que escreveu sobre temas universais com desenvoltura, assumindo também uma diccção grandiosa que nada fica devendo aos grandes poetas homens do seu tempo. No poema "A um mestre alquimista", a poeta faz uma alusão ao ato sexual com versos "Primavera: deitar-se, o teto é alto/só acordar à chuva, ao final da tarde".

Por isso mesmo, os poemas de Yu Xuanji sofriam mais com os moralistas da época do que com os humores tiramos em busca de maneiras de apagar seus próprio erros dos livros de História.

- No casa da poeta, as campanhas deste ou daquele governante tiveram efeito menos deletério que a longa sucessão de ambientes sociais moralistas e repressivos em relação à mulher. Sabe-se que uma parte considerável da obra da poeta se perdeu já no final da Dinastia Tang. Contribuiu para isso o fato dela ser uma personagem controversa, de vida livre e pouco convencional - Lembra Portugal.

Riqueza fonética da língua, um desafio para a tradução

Mas talvez o desafio maior do livro seja a própria tradução direta do chinês. Afinal a poesia chinesa é essencialmente musical, revelando elaborados jogos de sonoridades por conta dos caracteres, que misturam significados a sons. Esta sonoridade essencial, aliada a um poema que usa e abusa de vivências pessoais e referência biográficas como o de Yu Xuanji, tornaram a tarefa de traduzir a poesia chinesa em um trabalho extremamente sofisticado.

- A língua chinesa é foneticamente muito rica e é tonal, isto é, um poema clássico terá fórmulas de arranjos dos tons das palavras pelos versos. A poesia clássica é rimada e trabalhada, ainda em assonâncias e alterações internas ao verso. Além disso, o código escrito do chinês tem uma riqueza própria. A escrita é bastante independente da língua falada, em um código que combina imagens  visuais e sonoras. Ainda por cima, a poesia clássica trabalha contextos e referências de séculos atrás. Então, a tradução tem que ser muito criteriosa, acompanhada pesquisa histórica - observa o diplomata.

Fonte:

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