Carlos Estelita Lins
As festas que comemoram o fim de ano são para uma pequena parcela da população mundial catalizadores de processos depressivos. As comemorações, que para a maioria das pessoas motivam reuniões de familiares e amigos, costumam causar profunda angústia em pacientes com histórico de depressão, pessoas que atravessam perdas e cidadãos comuns que não conseguem calar suas inquietações com ritos maciços de consumo. As depressões constituem um espectro amplo e multietiológico de transtornos mentais comuns, nos quais aspectos sociais, individuais, biológicos e inconscientes conspiram gerando agravos à saúde.
Sofrimento, desânimo, tristeza, falta de prazer, perdas afetivas e prejuízo econômico são parte de quadros depressivos. A depressão e uso de álcool e drogas estão muito associados ao risco de suicídio. Num momento de maior vulnerabilidade, pessoas tentam pôr fim à própria vida buscando desesperadamente alívio psíquico imediato. Pelo enorme sofrimento e danos psicológicos que o suicídio causa nos familiares e nos sobreviventes, a Organização Mundial de Saúde (OMS) e outras instituições, como a International Association for Suicide Prevention (cujo braço brasileiro está sendo fundado) consideram-no com grave problema de saúde pública em todo mundo e se esforçam para divulgar as ações de prevenção. Sim, porque estudos demonstram que medidas preventivas apresentam impactos positivos. O Ministério da Saúde e a Associação Brasileira de Psiquiatria têm trabalhado desde de 2005 neste sentido sendo importante somar esforços com ajudas de políticos, empresários, formadores de opinião, terceiro setor e sociedade civil. O primeiro passo consiste em falar sobre problema de modo responsável.
Existem crises psíquicas. Fala-se pouco disto. A formação médica no Brasil ainda não contempla adequadamente o treinamento em emergências gerais, tampouco em urgências psiquiátricas. Nossa reforma psiquiátrica precisa retomar sua vocação inicial e assumir objetivos ligados ao plano nacional de reestruturação das emergências médicas, para o qual será preciso investir em parcerias com a universidade e a sociedade civil no sentido de fomentar o treinamento e repensar o uso das emergências.
Embora não se possa afirmar que os métodos de prevenção e intervenção em crises psiquiátricas sejam equivalentes aos de uma doença cardiovascular, por exemplo, há protocolos estabelecidos para controle da depressão e também de situações de risco iminente. O tratamento precoce de quadros depressivos constitui a pedra angular. Antidepressivos, estabilizadores de humor, eletroconvulsoterapia (ECT), psicoterapias e suporte psicossocial apresentam eficácia. Já existe consenso sobre o que fazer, como fazer e, sobretudo, aquilo que não se deve fazer diante de uma pessoa em crise. Se cada paciente acreditasse que seus sintomas e questões poderiam se transformar, diminuir ou desaparecer o desfecho poderia ser alterado e a ideia de suicídio, abandonada. É preciso oferecer ajuda. É preciso buscar ajuda. Ajuda médico-psicológica especializada precisa chegar àqueles que sofrem silenciosamente. Todos podemos ajudar
Fonte: Carlos Estelita Lins - psiquiatra, psicanalista, professor e pesquisador da Fiocruz (www.oglobo.com.br/opinião)
Comentários
Postar um comentário