Eles estão só, não falam porque acham que não serão ouvidos, e não acham nenhum adulto que os ajude.
Júlia, 15 anos, cursa o primeiro ano do ensino médio e quer parar de estudar. Neste ano, seu aproveitamento escolar foi, segundo ela mesma, péssimo. Não estudou, as notas nas avaliações foram muito baixas e não conseguiu estabelecer relação com nenhum colega de classe.
A escola avisou aos pais que o ano já está perdido e que, apesar dela ser bem comportada, no espaço escolar, não rende nos estudos e está sempre isolada.
A coordenadora sugeriu que os pais procurassem tratamento psicológico para a garota, porque ela pode estar deprimida por não ter conseguido se adaptar à nova escola, para a qual foi transferida neste ano.
Os pais tem uma hipótese a de que a filha foi vítima de "bullying". Por isso já tem uma solução para o problema - que é uma nova tranferência de escola.
Aliás, estão atualmente visitando escolas, conversando com coordenadores e consultando guias escolares para que, desta vez, façam uma escolha mais acertada.
E o que Júlia acha? Ninguém perguntou para ela, assim também como ninguém escuta o que ela tem adizer, de uma forma um tanto atrapalhada.
Júlia tem uma única solução para o que considera seu problema: deixar os estudos. E tem também uma reclamação: ninguém a leva à sério.
Luiza, 16 anos, passa por uma situação delicada, está grávida. Mas, segundo a mãe, por pouco tempo. A família irá providenciar a interrupção da gravidez. Já o namorado de Luiza, assim que soube do fato se apavorou. Disse à namorada que ele não pode contar com os pais , porque isso geraria problemas familiares muito graves. Pediu que ela conversasse com a mãe sobre o caso porque sabia que esta seria mais compreensiva.
O que Luiza pensa a respeito do seu estado, da reação do namorado frente à situação e, ainda, da decisão tomada pela mãe para acabar com o problema? Talvez sua melhor amiga saiba a resposta. Nenhum adulto com relacionamento próximo a ela conseguiu ou quis dialogar com ela a respeito. Luiza diz que isso não importa já que tudo será resolvido "da melhor forma".
Lucas entrou numa boa faculdade este ano. Foi sempre considerado bom aluno. "Nunca me deu problema antes" , diz a mãe.
Acontece que frequentar a universidade parece ter sido um fato decisivo para tirá-lo do seu prumo. Pelo esforço e pela boa colocação no vestibular, ganhou como prêmio um carro, que ele já bateu três vezes.
Agora Lucas deu de passar noites fora sem avisar aos pais e a beber em demasia. Atualmente não pode usar o carro - e não contestou a decisão tomada pelos pais. O jovem foi levado a um psiquiatra e com ele fez uma única consulta, mas se recusa a continuar o tratamento.
Seu pai desconfia de que ele usa maconha socialmente apenas. Por isso não considera necessário conversar com o filho sobre isso. Ele próprio, quando estava na universidade, fez uso esporádico da erva.
Quando perguntaram a Lucas porque ele tem agido assim, sua resposta é sair de perto dos pais, em silêncio e cabisbaixo.
Júlia, Luíza e Lucas representam muitos de seus pares na solidão em que se encontram. Não se entendem e não encontram nenhum adulto que os ajudem a se entenderem. Não falam porque acham que não serão ouvidos.
Com quem nossos jovens contam - além de especialistas aos quais são encaminhados para falar de suas angústias, seus medos, suas insatisfações - até mesmo do tédio que experimentam em suas vidas?
Qual é nosso papel e nossa responsabilidade para com eles?
Júlia, Luiza e Lucas gostariam de saber quais respostas nós temos para suas questões.
Rosely Sayão - É psicóloga e autora de "como educar meu filho?" (Publifolha)