Longevidade no Brasil "é quase um milagre"
Entrevista: Alexandre Kalache
Fonte: O Globo
Por Carol Knoploch
Presidente do Centro Internacional no Brasil, braço da OMS, afirma que o envelhecimento saudável passa por educação e condições favoráveis de vida.
Hoje é comemorado o Dia Internacional do Idoso e, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), no Brasil, esse grupo passará de 12% da população para cerca de 20% em 2050 - de 24,4 milhões para cerca de 70 milhões. Para Alexandre Kalache, é "quase um milagre" o Brasil ter conseguido aumentar a expectativa de vida da sua população, já que a maioria dos brasileiros não têm acesso às condições para que isso aconteça.
O envelhecimento saudável também é responsabilidade de cada um individualmente? O Brasileiro cuida da saúde como deveria?
Como comprar comida saudável e colorida se a população só tem dinheiro para o cardápio branco, como arroz, farinha e óleo? Como estas pessoas farão exercícios físicos se trabalham onze horas por dia e ainda encaram transporte público para chegar em casa? Vai correr na praça? Que praça? Onde esse cara mora não tem lugar para lazer. A responsabilidade de envelhecer bem é algo sempre complexo, que envolve educação até para que as pessoas consigam projetar o futuro. O brasileiro é imediatista porque tem de pensar em como pagar a conta no fim do mês. Tem mais dificuldade de pensar nos anos à frente. Além disso, um terço da população tem dificuldade de ler e escrever e não saberá fazer escolhas saudáveis. É preciso mais sensibilidade social.
Como o Brasil está em comparação com os países vizinhos em relação à saúde dos idosos?
Segundo dados da OMS, no Brasil a expectativa de vida de um bebê nascido hoje é de 75 anos, com cerca de dez anos com saúde debilitada. Em países vizinhos, como Argentina, Chile, Costa Rica e outros, a expectativa de vida é de 78 a 80 anos, com sete ou oito anos de doenças. Estamos pior. e se compararmos com países desenvolvidos, no Japão e Alemanha, pior ainda. Nesses lugares, as pessoas vivem até mais do que 80 anos e têm anos "extras" com saúde debilitada. Estes países enriqueceram primeiro e depois envelheceram. É quase um milagre o Brasil ter ganhado esse gap de longevidade. Quando eu nasci, há 70 anos, a expectativa de vida era de cerca de 43 anos.
Qual a atividade do Relatório Mundial sobre Envelhecimento e Saúde da OMS, que afirma que a quantidade de pessoas com mais de 60 anos deverá duplicar no mundo até 2050?
Não é uma novidade em relação ao conteúdo. É em relação ao foco. Este é o primeiro relatório da OMS sobre a longevidade e a primeira vez que o órgão olha com atenção o idoso. Os idosos são uma realidade no século atual. e a OMS está dizendo aos seus 193 países membros: acordem! É preciso pensar no idoso, temos de dar ênfase a eles. Porque o envelhecimento está chegando rápido.
Na sua opinião, o que é preciso fazer no caso do Brasil?
É preciso tornar os lugares em que vivemos ambientes amigáveis para as pessoas mais velhas, realinhar sistemas de saúde às necessidades dos idosos e que o governos desenvolva sistemas de cuidados de longo prazo que possam reduzir o uso inadequado dos serviços de saúde. O Brasil precisa dar atenção à educação. Incluo aqui mudanças nas faculdades de medicina, na formação educacional dos médicos. Hoje em dia eles estudam como se estivessem no seculo passado. Por que tantos especialistas em reprodução, se cada vez mais mais nascem menos bebês? Por que se estuda tanto sobre sobre criança, se a população está cada vez mais velha e tem mais cachorros do que bebês nos lares atuais? Precisamos de melhores cardiologistas, ortopedistas, geriatras e, de uma forma geral, que os médicos foquem nas doenças crônicas e que sejam antenados com o envelhecimento.
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