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VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER





VIOLÊNCIA DOMÉSTICA: A MULHER QUE DEMORA DENUNCIAR

A mulher vítima de violência doméstica que demora a denunciar, geralmente é criticada com certo rigor pela sociedade com frases do tipo "Por que demorou tanto tempo pra denunciar?" Aliás, esta frase é tanto usada por mulheres quanto por homens.




Este "apedrejamento" social não leva em conta os devastadores danos emocionais de alguém que vive uma situação desta natureza repleta de tantas mensagens dúbias. É uma pessoa que vem sendo "emocionalmente demolida" dia  após dia, alguém que perde a noção de dignidade pessoal a ponto de nem perceber que sofre violência. A violência física, pode ser, digamos, o "ponto alto" daquilo que o grande Gonzaguinha em sua obra prima Grito de Alerta fala:

 São tantas coisinhas miúdas, roendo, comendo, arrasando aos poucos o nosso ideal. São frases perdidas num mundo de gritos e gestos, num jogo de culpa que faz tanto mal (...).


O mesmo trecho da mesma canção quando diz: (...) arrasando aos poucos o nosso ideal, merece ser sublinhado. O ideal, o " e foram felizes para sempre" trata-se, na minha visão, de uma das complexas, sutis e perversas engrenagens da ideologia do patriarcado colocando no casamento, um dos itens que ainda hoje contam como grau de realização da mulher. Muitas vezes, custa muito manter este "ideal".


A mulher que sofre violência doméstica (seja, física, sexual, psicológica, patrimonial ou financeira) sempre tem o seu emocional "minado" como estratégia principal, por quase sempre ser um jogo cruel de "morde e assopra" (manipulação). Por conseguinte,  suas emoções oscilam entre elementos que convencionamos nomear com base no que observamos:

Auto destruição Com transtornos diversos como depressão, ideação suicida, ansiedade, hipertensão e toda sorte de doenças físicas), 

Auto engano Sentimentos de culpa, achar que é "assim mesmo", pois à mulher cabe se sacrificar "para tudo ficar bem" etc. A mulher pode até ser confundida num grau a ponte achar que está ficando louca, o que é chamado de gaslighting.  

Autoconhecimento Quando começa a questionar, ver as contradições... 

Um dos vários exemplos do que chamamos de auto engano: nós temos um sexo ótimo, mas quando saímos da cama, nada funciona na nossa relação, ele é o pai dos meus filhos... Desta forma, a mulher pode acabar aceitando os desconfortos em outros setores do relacionamento.


O auto engano tem no seu material anos de violência psicológica. Neste momento, a mulher pode nem se achar vítima de violência, cabendo a ela sempre "fazer tudo perfeito para não ter aborrecimento", sendo preferível atribuir  culpa a outros fatores externos ou indiretamente relacionados que orbitam na relação do que perceber que algo sempre esteve errado.

A ideia do "final feliz" e de que cabe à mulher ser a construtora desta "harmonia" composta de silêncio e submissão, pode ser uma estratégia de auto cuidado, embora frágil, mas possível de ser administrado pela pessoa, ou mesmo pode haver a decisão da mulher de não querer "ver" e se manter nesta situação.


A mulher que vive a dependência emocional (mais incapacitante do que a dependência financeira) do parceiro busca sempre atenuantes, além dos "pedidos de desculpas", dos "agrados" que permeiam este tipo de relação altamente tóxica, por ser repleta de mensagens confusas.


Quando a mulher se permite pensar sobre o que vive, é como "ir aos escombros, tentar peneirar entre as pedras" e tirar aquilo que é seu efetivamente. Isto, à primeira vista, nem sempre é nítido e rápido porque entre outras coisas, também tem o ideal. Este "garimpo" é profundamente doloroso, pois "em meio a todo pedregulho", existe muita auto-condenação, culpa, vergonha o "como deixei passar?", "o que os outros vão pensar"," como não vi?"... É o momento mais arriscado.


Há uma gama complexa de sentimentos. Antes de ser apedrejada pela sociedade por "conivência" com o agressor, esta mulher já apedreja a si mesma durante anos numa luta interna entre o auto engano, a auto destruição e o autoconhecimento.


A auto destruição é o surgimento de transtornos emocionais e doenças físicas diversas,  por um sentimento de impotência, cansaço, ou seja, uma gama complexa de emoções que podem incapacitar e levar à morte seja por suicídio ou outras doenças.


A auto destruição, o auto engano e o autoconhecimento podem acontecer ao mesmo tempo, uma predominando sobre a outra em diversas fases. Na minha opinião, a força de cada um destes elementos é que determinará a conduta da mulher.


A cantora Tina Turner passou anos sendo agredida, abusada sexualmente e humilhada pelo marido e seu partner no início de carreira já com sucesso, Ike Turner. Ela disse em sua autobiografia saber precisar sair daquela situação, mas não tinha força, até o momento que conseguiu e construiu uma história vitoriosa da mulher incrível que conhecemos, com seu talento e presença vigorosa. Atualmente aposentada do showbiz,  mas com aparições pontuais e sempre aclamada como uma das grandes divas do rock n´roll  se mantendo ainda relevante no cenário musical.


É legítimo que a mulher procure por um parceiro amoroso, mas que se mantenha atenta aos sinais. Não cabe, sob nenhuma hipótese, ser a harmonia do casal, pois ambos devem se empenhar juntos para construir uma relação positiva, apesar dos desafios nem sempre fáceis da vida à dois. Parceria de pessoas humanas e imperfeitas e não de pessoas ideais. Uma relação igualitária. 


Sabemos que a violência contra a mulher não tem cor, situação sócio-econômica.  Em alguns casos, nem mesmo a independência financeira impede (vide caso recente da atriz casada com o ex-embaixador).


 Ouso dizer que somada à independência financeira, é essencial a independência emocional, porque a mulher pode se precaver ou pode se recriar se escolheu erradamente por no fundo, saber que a única coisa que pode efetivamente possuir, é a si mesma. Do contrário, só licença poética. 

Você, homem que lê este texto demonstra querer entender sobre si mesmo como homem, assim como busca melhorar na relação com a parceira. Ser educado de modo machista não significa ser obrigado a reproduzir esta educação. É possível se abrir a outras reflexões e condutas. Há homens que querem aprender e há os que vivem naturalmente este relacionamento igualitário. São cada vez mais estes homens que as mulheres querem dividir a vida. Eles existem.

Os tempos estão mudando, mesmo que ainda as estatísticas pouco comprovem. Há ainda muitas mulheres que não se percebem em situação de violência. Nem sempre é fácil olhar para tudo isso e sair rapidamente. São transformações ao longo dos séculos que se dão entre avanços e recuos. Falar disso ainda é preciso. Refletir é preciso.


Há muito o que pesquisar no blog sobre feminismo, violência contra a mulher. Deixo um link:


Bela, recatada e do lar
Regina Bomfim - PSICOLOGIA EM FOCO

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Referências:


Sobre Tina Turner:
https://pt.wikipedia.org/wiki/Tina_Turner

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